O Brasil e o mundo vivem hoje sob uma conjuntura complexa e delicada, recheada de retrocessos e riscos políticos e econômicos – e em muitos aspectos especialmente adversa para a classe trabalhadora e o movimento sindical. Desde o golpe de Estado de 2016, travestido de impeachment, o movimento sindical e o conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras são vítimas de uma ofensiva impiedosa contra suas conquistas e direitos liderada pelo Estado.
Isto ocorre com total respaldo do empresariado urbano e rural e no curso de uma crônica crise econômica, que, em boa medida, resulta das políticas neoliberais impostas ao longo dos últimos quatro anos. O presidente Michel Temer, que assumiu a chefia do Executivo após a deposição injusta da presidenta Dilma Rousseff, cuidou de impor, com apoio do Parlamento e a conivência do Judiciário, um novo regime fiscal fundado no congelamento dos gastos públicos primários por 20 anos.
As consequências são cortes profundos no orçamento da Educação, Ciência, Tecnologia, Saúde, Segurança, Seguridade Social e outros bens e serviços públicos. Os investimentos do governo federal, sobretudo em infraestrutura, declinaram acentuadamente. O valor previsto para 2019 (de R$ 27 bilhões) é o menor dos últimos 14 anos.
As empresas estatais estão sendo sucateadas e, depois, entregues à iniciativa privada, com notório prejuízo para a Nação, os trabalhadores e o povo. A história ensina que, no Brasil em particular, mas também em outros países, os gastos e investimentos públicos são forças motrizes indispensáveis do desenvolvimento nacional. Não devem ser desprezadas e dispensadas, ao contrário do que advoga a ideologia neoliberal do Estado mínimo.
Nosso país atravessou em 2015 e 2016 uma das mais profundas recessões da sua história. O PIB recuou mais de 7%. Nos anos seguintes, em vez de uma recuperação cíclica, como geralmente ocorre, a economia estagnou. E a política fiscal tem muito a ver com esse desastre… O efeito mais dramático da crise é o desemprego em massa, que castiga cerca de 18 milhões de brasileiros e brasileiras. Neste total somam os que estão na condição de “desalento” e desistiram de procurar emprego.
Os salários estão em queda e a informalidade avança, em detrimento do que a OIT classifica de trabalho decente. Em abril deste ano, conforme estatísticas do IBGE, o número de trabalhadores que sobrevivem precariamente na condição de subocupados, trabalhando sem carteira assinada ou por conta própria, alcançou o número recorde de 28,4 milhões.
Sob o falso pretexto de que pretendia combater o desemprego, facilitando as contratações, o governo Temer também promoveu uma reforma da legislação trabalhista e a terceirização irrestrita das atividades empresariais. Nada disto contribuiu para a abertura de novos postos de trabalho. Pelo contrário – o que se vê é a extinção e flexibilização de direitos.
O resultado geral foi o maior empobrecimento da classe trabalhadora e a depressão do mercado interno. A reforma trabalhista do governo golpista teve igualmente o objetivo de enfraquecer a organização sindical, reduzindo a capacidade de resistência classista com o fim da Contribuição Sindical compulsória e a imposição de dificuldades adicionais à sustentação financeira dos sindicatos, federações, confederações e centrais.
Entre as novas medidas contra a classe trabalhadora encaminhadas pelo governo Bolsonaro destaca-se uma cruel reforma da Previdência. Ela acaba com a possibilidade de aposentadoria por tempo de contribuição, amplia o tempo de trabalho, reduz consideravelmente o valor dos benefícios, acaba com a aposentadoria especial em atividades insalubres ao estabelecer sem qualquer lógica um limite de idade. Essa maldade tem o aval do Parlamento, que é majoritariamente dominado por representantes da grande burguesia urbana e rural e políticos obscurantistas.
Este contexto de retrocesso ocorre em meio a transformações objetivas de grande impacto nas novas tecnologias incorporadas à produção. Embora alavancando a produtividade do trabalho, têm forte repercussão negativa sobre as relações de trabalho e o nível de emprego. Contraditoriamente com o que se deve esperar do progresso da produção, a chamada Indústria 4.0 vem acompanhada de maior desemprego e precarização.
Democracia e soberania nacional
A frágil democracia brasileira, mutilada pelo golpe de 2016 e a prisão injusta de Lula, está sob novas e mais sérias ameaças. A soberania nacional também está em xeque. Desde o golpe houve uma mudança radical da política externa brasileira. Isto culminou neste governo da extrema direita com o realinhamento aparentemente incondicional do Itamaraty com os Estados Unidos.
Por outro lado, estamos conscientes de que a defesa do Direito do Trabalho, do emprego, do desenvolvimento e do bem-estar social, está estreitamente associada à luta mais geral das nações, ao anseio da Humanidade por paz e prosperidade global, ao respeito à autodeterminação dos povos e ao desenvolvimento econômico com soberania e consideração ao meio ambiente.
A crise brasileira está claramente entrelaçada com a crise econômica e geopolítica que perturba o globo neste momento. E seu pano de fundo é o esgotamento da ordem capitalista mundial hegemonizada pelos EUA. Uma potência que reage ao próprio declínio ao desencadear uma temerária guerra comercial contra a China, com o propósito de conter a ascensão dessa milenar nação asiática.
Desde o seu congresso de fundação, em 2007, a CTB levanta a bandeira de luta por uma nova ordem mundial democrática e multilateral, alicerçada no princípio da não ingerência das potências na vida de outras nações. Bem como o absoluto respeito ao direito das nações à autodeterminação como pressuposto da paz internacional e da solução dos conflitos econômicos e políticos.
A criação do Brics – aliada com outras iniciativas das nações que compõem o grupo – sinalizou um caminho de transição para uma nova ordem mundial. Entretanto, desdobramentos recentes da política exterior norte-americana sugerem que a caminhada não está imune a conflitos e perigos.
A guerra comercial, que está deprimindo o comércio exterior e agravando os problemas da economia mundial, é uma prova disto. Isto sem falar das recorrentes ameaças contra nações consideradas inimigas pelos EUA, como o Irã, Síria, Cuba e Venezuela.
A conjuntura demanda das entidades representativas da classe trabalhadora, assim como do Brics Sindical, a crítica e o combate ao unilateralismo, a defesa do Direito Internacional, da autodeterminação dos povos, bem como da ONU e da OIT.
A CTB luta por uma nova ordem mundial democrática, solidária, orientada para a promoção do bem-estar e o combate às desigualdades regionais e sociais – desde que sem hegemonismo e intervencionismo, mas com respeito ao meio ambiente, aos direitos humanos, à diversidade e à igualdade entre homens e mulheres, negros e brancos, devendo rechaçar os preconceitos e discriminações sociais.
A CTB defende o fortalecimento do Brics e o reconhecimento formal do Fórum Sindical do Brics.
Viva o convívio democrático entre os povos, a democracia, a soberania, o meio ambiente, a valorização do trabalho e o bem-estar popular!
Por Mário Teixeira (CTB)
Mário Teixeira é secretário de Assuntos Jurídicos da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil). Texto baseado no em seu pronunciamento no 8º Brics Sindical, feito nesta terça-feira (17), em Brasília
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