Evento organizado pela Fitmetal em parceria com outras entidades reuniu sindicalistas, trabalhadores e economistas na sede do Dieese para discutir a indústria nacional. Luiz Carlos Bresser-Pereira durante fala no debate sobre a indústria nacional
O primeiro encontro do “Ciclo de Debates – Indústria e Desenvolvimento”, promovido pela Fitmetal e CTB, em parceria com CNM/CUT, CNTM/Força Sindical, CSP-Conlutas, Dieese e o Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé, aconteceu nesta terça-feira, dia 15, em São Paulo.
Em sua fala, o economista e ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, colocou que é necessário retomar a busca de um entendimento com o setor produtivo, a dúvida é sobre qual seria o interlocutor, em um momento que representantes da indústria se envolveram no impeachment e no processo de reformas.
Para a economista Marilane Oliveira Teixeira, pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit) e do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), “central hoje é recuperar uma ideia de nação, o papel do Estado”.
Marilane acredita que é preciso inicialmente reverter projetos aprovados no período recente, como a emenda que limita gastos públicos, a “reforma” trabalhista e a lei da terceirização. “Sem isso, é muito difícil discutir política industrial. Ela avalia que um dos equívocos do período imediatamente anterior foi acreditar ser possível conciliar interesses muito diferentes. Durante algum tempo, diz, isso foi possível porque a economia estava crescendo. “Um dos equívocos foi não disputar o Estado”, afirma a pesquisadora.
Em projeto de elaboração de um livro que deverá se chamar Nação, Estado e Desenvolvimento, Bresser-Pereira observa que os empresários foram sendo substituídos pelas financistas e pelos rentistas, dando vez à tecnocracia. “Com quem nos aliamos? Precisamos reconstruir a nossa classe empresarial”, diz. Se a opção é pela inserção à economia mundial, há duas formas de fazer isso, segundo ele: de forma subordinada ou competitiva.
“O nacionalismo dos anos 50 defendia a proteção da indústria nacional. Hoje, o ideal é que tenhamos igualdade de condições de competição.”
Segundo o economista, os modelos teóricos ainda se baseiam em Keynes, dos anos 1930, e em Celso Furtado, dos anos 1950 – nesse segundo caso, importante para o pensamento econômico brasileiro, mas uma teoria feita para um país pré-industrial. “Hoje, o Brasil é um país industrializado, em acelerado processo de desindustrialização”, afirma Bresser-Pereira, autor do manifesto chamado Projeto Brasil Nação, que considera uma “semi-estagnação” desde a década de 1990 e com séria recessão a partir de 2014.
As metas de seu projeto consideram cinco premissas: responsabilidade fiscal (“Não se resolve os problemas do Brasil aumentando a despesa pública, é um keynesianismo vulgar, que não leva a coisa nenhuma”), taxa real de juros em torno de 2% (a atual está em aproximadamente 6%), taxa de câmbio competitiva (ele fala em R$ 4), recuperação da capacidade de investimento do Estado e distribuição de renda. “A melhor coisa do governo Lula foi quando ele aumenta o salário mínimo em termos reais. Isso teve um efeito distributivo importante”, afirma.
Faltou, para Bresser-Pereira, pensar em um sistema tributário progressivo. “A esquerda esqueceu disso.” O economista também acredita que manter uma política de déficit de conta corrente é uma receita “para mantermos o subdesenvolvimento brasileiro”.
O diretor técnico do Dieese, observa que as ideias defendidas por Bresser-Pereira, como valorização do câmbio, podem causar perda salarial. Mas é necessário abrir diálogo com o setor empresarial, defende, mesmo sabendo que muitas empresas, hoje, não têm exatamente um “proprietário”, mas fundos de investimentos preocupados em garantir o maior retorno no menor prazo possível.
Clemente acredita que seria necessário um período de transição para o modelo proposto por Bresser-Pereira, considerando que muitas indústrias estão endividadas em dólar. Mas é preciso pensar em uma “reversão das maluquices que estão sendo feitas agora”, referindo-se às políticas do governo Temer. “O Brasil está sendo entregue. Estamos entregando a nossa economia ao mundo. Com essa política em curso, não há desenvolvimento econômico, não há desenvolvimento industrial, muito menos bem-estar social e qualidade de vida”, afirma. “O capital financeiro, manda, comanda e desmobiliza.”
Desmonte
Para a pesquisadora da Unicamp, três décadas de globalização romperam as cadeias produtivas e desestruturaram setores inteiros da indústria, em um crescente processo de financeirização da economia e o desafio de enfrentar “um capital cada vez mais internacionalizado e rentista”, com empresas nas mãos de fundos de investimento e de pensão e redução de investimentos de empresas estatais. “Com o desmonte da Petrobras, a gente perde um setor fundamental pera retomar os investimentos”, diz Marilane.
Ela vê “certa exaustão” no modelo de consumo/crédito, com alta do endividamento familiar. “Que mercado de consumo se espera no próximo período, quando as formas de contratação vão se multiplicar? A gente precisa repensar nossa matriz de produção, de consumo.”
Segundo o presidente da Fitmetal, Marcelino da Rocha, este ano o setor industrial deverá fechar com 9% de participação no Produto Interno Bruto (PIB), que chegou a ser de quase 30%. “O Brasil se transformou numa banca de feira de negócios. Estamos sendo fatiados, leiloados e entregues”, afirmou, enfatizando a importância da unidade das centrais sindicais.
Membro da direção da CSP-Conlutas e do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, no interior paulista, Alex da Silva Gomes, o Cabelo, destaca as mudanças nas relações de produção e na composição das empresas. Cita o exemplo da Embraer, privatizada e posteriormente desnacionalizada. “Na nossa opinião, é muito difícil compor um plano de desenvolvimento nacional com os patrões”, afirma.
O secretário de Política Sindical da CNM-CUT, Loricardo de Oliveira, relata dificuldades nessa discussão, na medida em que os trabalhadores, por exemplo, defendem uma política de conteúdo local, enquanto muitos empresários querem apenas atrair capital externo. “Não temos dúvida que o Estado é o propulsor da economia”, diz, lembrando que os metalúrgicos estão desenvolvendo um instituto para discutir coletivamente e formular propostas para o setor industrial.
O secretário-geral da Força, João Carlos Gonçalves, o Juruna, afirma que o debate já se insere no processo eleitoral de 2018. Considerando não ser possível formar uma chapa só de esquerda, ele defende buscar alianças com setores “que são prejudicados pelo sistema financeiro, que possam fazer com a gente um projeto de nação”.
Bresser-Pereira acredita que é possível construir um pacto político sob um projeto de industrialização. “Só uma nação forte, capaz de saber o que quer e para onde vai, é capaz de produzir desenvolvimento econômico”, afirma o ex-ministro, que disse ter ficado surpreso, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, pelo “desinteresse” em relação à ideia de nação.
Fonte: Vitor Nuzzi, da RBA / FITMETAL
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